Resumo de Sagarana – A Hora e a Vez de Augusto Matraga
Enredo
Augusto Esteves, filho do Coronel Afonsão Esteves, das Pindaíbas e do Saco-da-Embira, conhecido como Nhô Augusto e também como Augusto Matraga, é o maior valentão do lugar, briga com todo mundo e maltrata por pura perversidade. Debochado, tira as mulheres e namoradas dos outros. Não se preocupa com sua mulher, Dona Dionóra, nem com sua filha, Mimita, nem com sua fazenda, que começa a se arruinar.
Já em descrédito econômico e político, sobrevém o castigo: sua mulher, Dionóra, foge com Ovídio Moura levando a filha, e seus bate-paus (capangas), mal pagos, põem-se a serviço do seu pior inimigo; o Major Consilva Quim Recadeiro foi quem levou a notícia da defecção dos capangas. Nhô Augusto resolve ter com eles, antes de matar Dionóra e Ovídio, mas no caminho é atacado, numa tocaia, por seus inimigos, que o espancam e o marcam com ferro de gado em brasa. Quase inconsciente, no momento em que vai ser assassinado, reúne as últimas forças e se atira no despenhadeiro do rancho do Barranco. Tomam-no por morto. É, contudo, encontrado por um casal de negros velhos: a mãe Quitéria e o pai Serapião que tratam de Nhô Augusto, que sara, mas fica com seqüelas deformantes.
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Começa então uma nova vida, no povoado do Tombador, para onde levou os pretos, seus protetores. Regenera-se e, esperando obter o céu, leva uma vida de trabalho duro, penitência e reza. Arrependido de suas maldades, ajuda a todos, e reza com devoção: quer ir para o céu, “nem que seja a porrete”, e sonha com um “Deus valentão”.
Passados seis anos, tem notícias de sua ex-família através de Tião da Thereza: a esposa, Dona Dionóra, vive feliz com Ovídio, e vai casar-se com ele; Mimita, sua filha, foi enganada por um cometa (espécie de caixeiro viajante) e caiu na perdição. Matraga sente saudades, sofre, mas se resigna.
Certo dia, aparece o Joãozinho Bem-Bem, jagunço de larga fama, acompanhado de seus capangas: Flosino Capeta, Tim Tatu-tá-te-vendo, Zeferino, Juruminho e Epifânio. Matraga hospeda-os com grande dedicação e admira as armas e o bando de Joãozinho Bem-Bem. Mas se recusa a acompanhar o bando, mesmo convidado pelo chefe e não aceita qualquer ajuda dos jagunços. Quer mesmo ir para o céu.
Totalmente recuperado, Matraga despede-se dos velhinhos e parte, sem destino, num jumento. Chega ao Arraial ao Rala-Coco, onde reencontra Joãozinho Bem-Bem e seu bando, prestes a executar uma cruel vingança contra a família de um assassino que fugira. Augusto Matraga desperta para a sua hora e vez: intervém em nome da justiça, opõe-se ao chefe do bando, liqüida diversos capangas, tomado de verdadeiro furor. Bate-se em duelo singular com Joãozinho Bem-Bem. Ambos morrem – Joãozinho primeiro. Nessa hora, Augusto Matraga é identificado por seu antigos conhecidos.
Personagens
1. Augusto Matraga: Filho do fazendeiro e coronel Afonso Esteves, órfão de mãe, era conhecido por todos da região como Nhô-Augusto. Homem brigão, temido por todos, passava a vida bebendo e vadiando com outras mulheres. Deixava sua mulher e sua filha em casa, enquanto aproveitava a vida. Um dia, ficou muito endividado e perdeu os amigos e a mulher para outro. Além disso, levou uma surra e quase morreu. Depois disso, se converteu e morreu preocupado com a salvação de sua alma.
2. D. Dionóra: Mulher de Matraga, desprezada por ele. Acaba fugindo com outro homem, mesmo sabendo que ele poderia matá-la. Nunca mais viu o marido e nem foi vista por ele.
3. Mimita: Filha de Matraga. Foge com a mãe e acaba caindo na vida com um sujeito desconhecido.
4. Ovídio Moura: Homem com quem D. Dionóra fugiu.
5. Quim Recadeiro: Amigo fiel de Matraga, tentou evitar que Dionóra fugisse. Quando Matraga leva uma surra e é tido como morto, ele tenta vingá-lo e acaba sendo assassinado.
6. Major Consilva: Dono de terra e rival de Matraga. Mandou mata-lo após uma emboscada.
7. Casal de Negros: mãe Quitéria e pai Serapião. Cuidam de Matraga após ter sido pego em uma emboscada e é tido como morto. Esse casal lhe ensina a moral cristã.
8. Bando de Joãozinho Bem-Bem: Flosino Capeta, Cabeça-Chata, Tim Tatu-tá-te-vendo, Zeferino (gago), Epifâmio e Juruminho (foi assassinado no final e Joãozinho volta ao lugar para vingar sua morte e acaba reencontrando Matraga). Joãozinho tem muita afinidade com Matraga, mas ambos morrem no final depois de lutarem um contra o outro.
9. Tião da Thereza: conhecido de Matraga, o encontra e descobre que ele não estava morto. Passa, então a lhe contar o que acontecera a Dionóra e Mimita.
10. Prostitutas: Angélica e Siriema: são leiloadas no início de uma festa popular e Matraga ganha Siriema porque era temido. Quando ela tira a roupa, desiste de ficar com ela por considera-la feia.
11. Padre: É chamado pelo casal de velhos para abençoar Matraga e disse para ele: “sua hora chegará”. Matraga repete essa frase até o final do livro, todas as vezes que se lembrava das injurias que sofreu.
Análise
Narrado em terceira pessoa, o conto enfatiza duas constantes da vida do sertão: a violência e o misticismo, na interminável luta do bem e do mal.
Observe a importância do número três durante toda a narrativa: a personagem principal tem três nomes – Augusto Matraga, Augusto Esteves e Nhô Augusto -; os lugares em que transcorrem as fases de sua vida também são três – Murici, onde vive inicialmente; o Tombador, onde faz penitência; o Rala-Coco, lugarejo próximo a Murici, onde encontra sua hora e vez. Além disso, ele também vive em trios: inicialmente, na praça, ele está com duas prostitutas; em casa, ele vive com a mulher e a filha; depois de ter sido surrado e marcado a ferro, vive com um casal de pretos; e, no final, aparece um último trio: ele, Joãozinho Bem-Bem e o velho a quem protege.
Por meio de vários elementos simbólicos, “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” trata de um tema muito presente na obra de Guimarães Rosa: o maniqueísmo, ou seja, a visão dualista de mundo que o separa em dois polos opostos: o bem e o mal. Na literatura, essa visão tende a criar tipos opostos de personagens: o mocinho e o bandido; a virgem casta e pura e a prostituta devassa; o trabalhador pai de família e o bandido; e assim por diante. Nesse conto, a transformação por que passa Augusto Matraga entre o começo e o fim da história não permite seu enquadramento em um polo único.
No início do conto, Nhô Augusto é uma figura típica do universo sertanejo: um coronel que dá ordens em todos na região, abusando de seu poder e humilhando a população. Nesse ponto da narrativa, o narrador dá ao nome completo de Nhô Augusto um significado interessante. Augusto pode ser lido como um adjetivo, que significa majestoso, imponente. Basta lembrar que era o título dado aos imperadores romanos. Estêves, por outro lado, pode ser entendido como a conjugação do verbo “estar” no passado. Assim, o narrador anuncia desde o começo, pelo nome do personagem, que sua condição de soberano no sertão está fadada ao insucesso. O nome Matraga, uma espécie de apelido de Nhô Augusto, tem claramente uma conotação pejorativa (má + traga, de tragar ou do verbo trazer).
Uma análise do nome Joãozinho Bem-Bem é ainda mais reveladora. Joãzinho, um nome comum, e no diminutivo, parece indicar um lado afetivo, quase infantil, do personagem que é um jagunço. O advérbio Bem confirma o caráter inofensivo do primeiro nome, e sua repetição (Bem-Bem) gera uma sonoridade cara ao povo sertanejo e cristão. Esse efeito é a onomatopéia do badalo do sino de uma igreja. Tantas referências cristãs e benévolas que o nome Joãzinho Bem-Bem sugere, no entanto, parecem absolutamente opostas ao caráter do personagem.
Na narrativa, diferentemente de Nhô Augusto, não se sabe nada sobre a vida de Joãozinho Bem-Bem antes que ele se encontre com o protagonista. Porém, é possível supor que o nome e, sobretudo, o apelido revelem algo da origem do personagem. Assim, pode-se interpretar que os primeiros anos do jagunço foram marcados por uma bondade intensa, da mesma intensidade que seu nome sugere.
A maldade de Joãozinho Bem-Bem foi incorporada no decorrer de sua vida. Outro dado que comprova essa análise é o fato de ele “não ter fraco por mulheres”. Um homem que não aprecia a companhia feminina na cultura sertaneja não goza de grande prestígio social. Apenas um tipo de homem no sertão tem o direito de não cobiçar as mulheres sem ser tratado como efeminado: um padre. Assim como Nhô Augusto nasce mau e se torna bom, Seu Joãozinho Bem-Bem parece tornar-se mau depois de ter sido bom.
Essa transformação radical dos personagens tem fim com a chegada da “hora e vez” de Matraga, o confronto final com Joãozinho Bem- Bem. Nesse duelo fatal, os conceitos de bem e mal caem por terra, pois o “bom” Augusto Estêves e o “mau” Joãozinho Bem-Bem envolvem-se em uma ação que supera o maniqueísmo: o primeiro faz o bem à família cometendo assassinato, enquanto o segundo, ao assassinar o protagonista, dá-lhe sua redenção.